sábado, 21 de março de 2015

O SACO




O saco era grande e chegava quase vazio.
Às nove e meia de todas as manhãs, era agarrado pelas «orelhas» e levado a arrastar estrada abaixo, numa correria alegre.
O SACO!
O saco chegava na camioneta da carreira!
Qualquer criança, das muitas que nessa altura havia, disputava a guarda e entrega do saco.
Era quase um crescer da sua vaidadezinha de meninos! Ser portador daquele saco, era uma responsabilidade, pois não se tratava de um saco qualquer!
Aqueles corpitos frágeis e aquelas mãos pequeninas tinham uma missão que não podiam falhar: entregá-lo em mãos seguras no posto do correio.
Era aguardado  com alguma ansiedade. Mulheres, namoradas e claro, os comerciantes da aldeia,desejavam que lá dentro viesse a perspectiva da continuação de uma vida sem percalços.
O que traria hoje o saco?
Só depois de aberto por alguém possuidor da chave, se saberia!
Era uma chavinha pequena mas especial! Era guardada em sítio seguro e só de lá saía no momento certo, manuseada pela pessoa certa!
Penetrava a fechadura, rodava e só depois os segredo ou não, poderiam finalmente ser entregues e lidos.
As boas ou as más notícias, as juras de amor ou as despedidas até mais ver!
Os nomes dos destinatários eram lidos em voz alta:
«Senhora fulana de tal! Menina Tal e Tal»! ...
«E do meu filho, não veio nada»?
«O meu homem já me devia ter mandado o vale»!...
Estávamos no início da primeira debandada de emigrantes que, mensalmente, enviavam o pecúlio que com grandes sacrifícios, conseguiam angariar.
Felizes uns,  outros nem tanto, lá aceitavam a realidade, porque a esperança não podia morrer!
«Devem chegar notícias amanhã», dizia a mulher de lenço preto na cabeça, afastando-se cabisbaixa.
Era assim nos anos sessenta.
Tudo dependia da camioneta da carreira e do que aquele saco trouxesse.
Os interessados esperavam ansiosos e em grupo,a camioneta com o saco do correio.
Era um momento do dia com alguma importância.
Hoje, poucos se lembrarão daquele saco!
O objecto em tempos tão desejado, jaz esquecido e coberto de pó não se sabe onde!
Coisas dos tempos!


Abraço.  

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