terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Preocupações de pais



Era meio da tarde e as crianças brincavam no recreio.
Alguns pais mais disponíveis começavam a chegar e procuravam saber junto de cada responsável como tinha sido o dia da sua criança.
A preocupação principal de grande parte deles era se o filhote tinha comido ou não.
Sempre foi assim. A esses, não os preocupava a qualidade alimentar, nem outros aspectos importantes envolventes. Apenas se comiam ou não.
Foi um aspecto que sempre me intrigou.
Os meninos guardadinhos e de barriga cheia!...
Numa dessas situações de preocupação alimentar, a mãe queixava-se de que o menino, de manhã, não tinha querido nem sequer, o iogurte!
Um pouco afastado e «com um olho no burro, outro no cigano», estava o condutor de uma das carrinhas.
Homem de poucas falas. Educado, bom profissional, alentejano de Arronches.
Criado apenas pelo pai e uma madrasta pouco sensível.
Os castigos da vida eram mais que muitos.
Ouviu, ouviu, e, de repente, penso que depois de dar uma olhadela pela sua própria vida passada, disse baixinho:  «É como ó mê pai, tamém mi dezia todas as manhãs: comi o iogurti Álvaro!... Comi!».
Eu estava próximo, ouvi o comentário acintoso mas dito com muita piada!
Foi uma gargalhada espontânea, que tive de disfarçar com algum esforço.
A vida massacrante e cheia de dificuldades não retirou àquele alentejano esclarecido o humor e a capacidade de observação.
Muito boa gente, o senhor Álvaro!

Abraço.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

Coliseu dos Recreios




Não sei quantas vezes eu já passei por aquela porta!
Às vezes em trabalho, outras para ver espectáculos que me interessam.
 Uma das actividades que me levaram lá com alguma frequência foram os espectáculos de circo pelo Natal.
As crianças com quem então trabalhava assim o exigiam.
Depois de tudo programado atempadamente, em fila indiana e grande excitação, tinha a difícil tarefa de levar e trazer de volta sãs e salvas, as crianças daquele grupo que me era confiado.
Era com prazer que desempenhava aquela tarefa.
Só para ver os rostos daquelas crianças inundado de alegria e os seus gestos de entusiasmo e espanto, valia a pena não falhar o espectáculo.
 Eram momentos esfuziantes e compensadores.
A hora dos palhaços era a mais esperada.   
Este fim-de-semana «fui várias vezes ao Coliseu» sem querer.
Nas horas em que liguei a TV, normalmente para ver as notícias, lá estava o Coliseu.
Abarrotava de gente que berrava, gesticulava, e até faziam gracinhas!
Mas… olha! Estes não têm o chapéu de palhaços, nem nariz abatatado!...
Só fazem piruetas umas atrás das outras, como que para ver quem faz a melhor!
Estavam todos, desde o palhaço pobre, até ao palhaço rico.
Alguns deles, até fazem comentário político. Mas… ali, não contestaram nem criticaram.
Apenas se limitaram a ser todos muito amigos!... Tão queridos.
Barões, baronesas, todos em cavaqueira amiga!
Que saudades dos palhaços a sério e de programas que eduquem, que instruam e abram horizontes a quem não os tem!...
Raio desta palhaçada.

Abraço.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Eu chamo-me…





O nome.
O nosso nome.
O nosso nome faz parte de nós, da nossa identidade.
Está colado a nós, quer gostemos dele ou não, e acompanha-nos até ao fim e para lá do fim.
Por ser assim, tomamos posse dele e detestamos que alguém, por engano ou desconhecimento, nos chame qualquer outro que não o nosso.
Quando isso acontece, não gostamos muito, sentimo-nos desconfortáveis e olhamos até meio atravessado.
Embora não o confessemos, é com se nos roubassem um bocadinho de nós.
Aconteceu-me outro dia, ao responder a uma mensagem que me foi enviada.
Essa mensagem que eu escrevi de boa fé e com o intuito de agradar, foi apagada por quem a recebeu e que apagou também o que o próprio escreveu.
Esse gesto fez-me parar para pensar.
Nada naquele texto poderia ser motivo para apagar o que escrevi.
Então! …Ah! O nome. Tratei a pessoa que até está fragilizada, por um nome que não lhe pertence.
Penso que poderá ter sido isso que fez a pessoa sentir-se mal.
Talvez pensasse que não tem para mim qualquer importância, pois nem o nome dela sei!
Nada disso. Sou distraída, é o que é, li de relance e escrevi o mais óbvio.

Abraço.


sexta-feira, 14 de fevereiro de 2014

Os tempos e os afectos






Felizmente, de há um tempo para cá, ouve-se e lê-se alguma preocupação com a falta de sensibilidade, afectos e solidariedade entre as pessoas.
O estilo de vida criado é talvez o responsável por isso.
Talvez por causa dele se tenham aberto as portas ao isolamento, às relações descartáveis desapegadas e frias, que reinam por aí.
Talvez essa vida cheia e em corrida seja a responsável pela falta de tempo para a amizade, para a partilha e para o contacto, que quanto a mim é tão necessário?
Esta vida vivida em «stress», que passa quase sem darmos conta, é que faz a diferença.
A falta de tempo para o contacto com os outros separa-nos e convence-nos de que nos bastamos a nós próprios.   
Para minorar essa lacuna, temos agora os meios virtuais que, se bem utilizados, ainda vão mantendo alguma ligação.
Mas e o toque?
E os olhos?
 E as vivências em directo, as sensações que ficam diluídas na distância?
Não é por acaso que, em algumas redes sociais, se recordam com saudade os tempos em que o convívio são e desinteressado acontecia entre os pares!
E estou certa de que não é saudosismo.
É, sim, a falta que faz uma vida vivida com mais amizade, mais ternura e solidariedade.  


Abraço.

terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Objectos com vida






















Conheço-os desde criança: a braseira e a caldeirinha de cobre, os pratos antigos, as panelas de ferro... e muitos mais.
Convivi com eles diariamente.
Alguns eram mais mimados que outros, eram considerados nobres.
Esses viviam a maior parte do tempo em «exposição».
Só em dias «ass’lanados» (assolenados ou seja: meio solenes) é que desciam a desempenhar as funções para que tinham sido concebidos.
Os outros, os mais vulgares, estavam de serviço todos os dias.
Cada um me recorda momentos, sítios, gestos, sabores, cheiros e convívios saudáveis
Falam comigo e levam me ao devaneio quando os olho.
Mantêm-me ligada às pessoas e às origens e ao berço onde nasci.
É qualquer coisa de muito forte que me liga a eles.
Sinto-os com se fizessem parte de mim.
Sinto que, se me desligasse deles, abafaria parte do meu passado.
Com eles recordo os convívios que «à volta deles» aconteciam.
Recordo os olhos que sorriam com carinho, os gestos de ternura e as palavras amigas.
Recordo, ainda, a força da amizade e da solidariedade que eram verdadeiras e indispensáveis.
Alguns desses objectos estão comigo.
Funcionam como um laço que me amarra ao passado e aos meus.     
Objectos sem grande valor económico, mas com um valor estimativo sem tamanho!...
São os meus ontens que, felizmente, não morreram em mim.

Abraço.


quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014

Com Mozart em fundo

 



Quase no fim de uma aula de Pilates e já em tempo de alongamentos, eis que uma tempestade de vento e chuva, tirou do silêncio o grupo que se entregava ao prazer do relax.
O corpo saiu da quase «letargia» em que se encontrava e o cérebro, alarmado, questionou-se.
Ninguém merecia aquele «acordar» violento.
Ainda menos, quando se relaxa ao som de uma peça de Mozart e num silêncio que quase se ouve.
A Natureza tem as suas regras. Ninguém a detém.
O Homem, aquele ser que tantas vezes se deslumbra perante o que considera os seus grandes feitos, é nada, perante tão grande potência.
 Não existe ninguém, que se sobreponha à força inimaginável dos fenómenos que, de quando em vez, nos fazem descer do nosso palanque e olhar respeitosamente.
Somos seres minúsculos e insignificantes, melhor seria remetermo-nos à nossa pequenez.
Meio atordoado, o grupo manteve-se quieto.
Respeitosamente.
Mozart continuava em fundo.  
 Terça-feira haverá mais Pilates.
Um intervalo bom, na vida de futuro incerto.

Abraço.

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Surpresas





Nem sempre as surpresas são agradáveis.
Infelizmente, nestes últimos tempos, surgem umas atrás das outras em catadupa, cada uma
pior que a outra.
Vamo-nos dando conta de que nem «uminha» só, para nos alentar o espírito!
As gentes destes lados do planeta andam inseguras, sisudas e meio desnorteadas.
Vivem na expectativa.
O presente é carga demasiado pesada e o futuro, para muitos, é incerto.
Caminham com alguma dificuldade. O arcaboiço verga com a carga.
O cérebro desdobra-se a inventar formas de…
 Precisa-se de algo que nos devolva o ânimo.
De qualquer coisa que nos traga a esperança e o sorriso de volta.
Qualquer coisa que nos devolva o conforto e o alento.
Que nos faça pensar que, num dia não muito remoto, iremos novamente ver a vida com alguma leveza.
Entretanto, não há outra forma.
Orgulhemo-nos de que, apesar dos desafios e das dificuldades, não perdemos nunca, a dignidade.
É bom acreditar que, a qualquer momento, pode aparecer uma surpresa boa.
Daquelas que nos preenchem a alma e nos aquietam o espírito!
 Segurança e confiança - é o que precisamos.    

Abraço.

.