quinta-feira, 6 de novembro de 2014

O comboio do meu desencanto

 



O comboio da Beira Baixa de há quarenta anos marcou a minha vida de jovem.
Sempre desde que me conheço houve carro lá em casa e por isso não precisei de o utilizar nunca.
Utilizei -o apenas após me casar, nas idas e vindas de e para Lisboa.
Já há algum tempo falei aqui de como me foi difícil sair da minha terra, mas por uma questão de enquadramento vou fazê-lo hoje outra vez.
Fui criada no Casteleiro e muito agarrada à família, às tradições e às vivências diárias.
Custou-me imenso largar tudo e sair para um meio que desconhecia.
A primeira viagem foi no dia em que casei.
Nesse dia era festa, não cabiam questões de outra natureza que não fosse o sonho! 
Tudo se alterou quando se tornou uma situação necessária e de rotina.
 Ir ao Casteleiro, tudo bem. Mas regressar era sempre aquele drama!
Aquele comboio ronceiro, barulhento, maçador e com um cheiro intenso a óleo, era deprimente.
Era desconfortável e albergava gente para lá do que podia e devia: era um armazém apinhado e mal arrumado de humanos e de bagagens de toda a espécie!
Uns sentados em bancos frios, outros em pé, durante as nove/dez horas que demorava a viagem.
Para mim, tempo demasiado desgastante a nível físico e emocional.
Sentia que aquele comboio deprimente me afastava a cada minuto, para mais longe do meu berço aconchegante e tão cheio de afectos.
O dia que mais me marcou foi aquele em que tive que me despedir de minha mãe por dois anos, na estação de Belmonte.
Esse dia deixou a marca das marcas!
Cheguei a Lisboa desfeita e de olhos inchados!
A partida para Angola a acompanhar o marido que forçadamente fora levado para a guerra, impunha-se.
Foi uma opção demasiado dolorosa e que nunca esquecerei!
Aquele comboio foi uma vez mais o monstro de mais uma estória da minha vida!
Hoje tudo é diferente, mas aquela imagem, aquele som e aquele cheiro continuam nas minhas memórias. 


Abraço.

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