Gosto de ter memórias.
Gosto de constatar que tive um ontem que me deu imenso.
Desde alegrias a vivências cheias de conteúdo afectivo e até
às aprendizagens em directo.
Tudo isso tem preenchido e completado a pessoa que sou.
De vez em quando, recordo lugares e factos que me foram tão
familiares!
Que me deixaram na memória cheiros, sons, e saberes tão enriquecedores
e tão inesquecíveis.
Hoje, como já me tem acontecido tantas vezes, lembrei-me do
ribeiro da minha rua.
Aquele ribeiro corria quase todo o ano.
Uma água cristalina, que marulhava suavemente e escorria
terras abaixo ao encontro de outros que encontrasse pelo caminho.
Era muito útil aquele ribeiro.
Fizeram de parte dele uma pequena represa onde foi lavada a roupa
de muitas famílias.
Sem máquinas de lavar, era naquela água corrente que se lavava
e era num espaço envolvente que se branqueava a roupa, que chegava muitas vezes
marcada pelo trabalho duro do campo.
Dava gosto olhar e cheirar aquelas peças.
Qual lixívia, quais detergentes!
As mãos, a água, o sabão em barra (azul e branco ou cor-de-rosa
e branco) – e o sol eram o milagre!...
E o convívio?
Digno do filme «A aldeia da Roupa Branca».
De línguas afiadas todo o tema servia para nem sequer se darem
conta da pesada tarefa.
E as cantigas? Havia sempre uma que as berrava (a cantar,
bem alto).
De joelhos, a roupa levava voltas quase intermináveis.
Só quando estava da cor do sol, é que repousava finalmente
no fundo dum cesto ou alguidar, de regresso a casa.
O ribeiro da minha rua.
Quantas loucuras, quantas gargalhadas, quantos segredos, tu guardaste.
Era o teatro, eram as tertúlias, eram as conversas de
escárnio e maldizer da época passada.
O ribeiro da minha aldeia, no seu eterno marulhar.
Poético, aquele som.
Abraço.
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