Ontem, foi o Dia Mundial da Rádio.
Há muito tempo, nos anos cinquenta sessenta, o rádio era um
objecto de luxo.
Muito pouca gente tinha acesso a esse bem.
Na minha aldeia haveria meia dúzia, se tanto.
Era uma companhia, um divertimento e uma fonte de
informação.
Em minha casa havia um aparelho desses.
Era através dele que o meu pai, às tantas da noite, ouvia com
o som baixinho no recato da sua casa, a Rádio Moscovo.
Nessa altura era proibido ouvi-la.
Falava de assuntos que em Portugal eram tabu absoluto.
Esclarecia e mostrava caminhos.
Era uma rádio clandestina e por isso era ouvida quase em
segredo.
Não esquecer que nessa altura, cá, se vivia no mais profundo
obscurantismo.
Era a época da ditadura.
As notícias que passavam na nossa rádio eram filtradas e
censuradas.
Só «saía» o que o governo vigente autorizava.
Por isso os que podiam tentavam, por aí, penetrar nos
assuntos que lhes eram vedados.
Era muito difícil apanhar a frequência, só se conseguia por
volta das onze, meia-noite ou mais.
Lembro-me que, na nossa rádio, passavam música todo o dia.
Havia aqueles programas de discos pedidos e era sempre a
sair.
«Posso pedir um disco»?
Transmitiam também rádio-novelas.
Nessa altura (tal como agora na nossa televisão), tinham
lugar de destaque na programação.
Passavam por volta das duas da tarde.
A essa hora, o som do rádio era posto no limite, para a que
as vizinhas pudessem
seguir o enredo.
Lembro-me que eram rádio-novelas patrocinadas pelo
detergente Tide.
Eram chamadas as novelas «da» Tide.
Tinham imensos os folhetins e toda a gente aguardava
ansiosamente pelo próximo.
Às vezes era de cortar à faca.
Quando as cenas aqueciam, tudo chorava e dava palpites sobre
o que achavam que deveria acontecer.
O rádio era realmente uma companhia e um meio de
divertimento.
Havia também um programa que era feito em directo por um
grupo de actores, que se chamavam os Companheiros da Alegria.
A essa hora, toda a gente ria com as piadas quase inocentes
que diziam.
As músicas que passavam davam muitas vezes para um ou outro
bailarico.
Punha-se o rádio na janela.
Na rua, os jovens faziam a «festa».
Com a chegada da televisão, a rádio ficou um pouco mais na
sombra.
Tirou-lhe um pouco a importância que tinha então.
No entanto, nunca foi dispensada.
Pelo contrário, ainda hoje é um meio de contacto, diversão e
informação.
Hoje, felizmente, não há censura (?).
E os conteúdos já podem ser outros.
Era assim nos tempos do obscurantismo.
Abraço.
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