quinta-feira, 10 de maio de 2012

Estio


















Nesta manhã de Maio, eis que o calor se apresenta furioso.
Um calor repentino. E quase só a brisa marítima o faz disfarçar um pouco a fúria.
Não sei bem porquê, fez-me lembrar a azáfama das ceifas.
Lá longe!
No tempo e na distância.
Estava eu a começar a ser gente.

Sempre olhei com respeito aquele ritual metódico e árduo.
Havia entre as pessoas, homens e mulheres, uma organização e inter-ajuda que acontecia quase em silêncio.
Como que com respeito pela calmaria
A dureza da tarefa não permitia grandes manifestações.
Só de vez em quando como que a disfarçar a mágoa de tanto sofrer, uma voz se levantava e cantava.
Cantava alto!
Arrastando por vezes outras.
A maior parte das vezes eram cantes melancólicos e arrastados.
O corpo moído e a voz ressequida não permitiam muito mais…

Havia sempre de serviço uma pessoa que chegava àqueles lábios sequiosos um pouco de água.
Jorrava de uma cantarinha de barro.
Todos bebiam do mesmo copo.
Normalmente, uma mulher executava aquela tarefa.
Uma mulher das menos resistentes.
Que ceifa não era para qualquer um.
Para consolo do grupo, havia ao meio-dia o «jantar».
Um jantar melhorado.
Os donos da safra faziam questão.

Escolhiam a melhor sombra.
Exaustos, sentavam-se no chão à volta da toalha recheada.
Duas coisas não podiam faltar: papas de carolo de milho e o vinho refrescado.
Não havia frigoríficos, mas havia quase sempre um poço ou uma ribeira onde meter o garrafão.

Outros tempos.
Não havia regalias.
Apenas trabalho.
Trabalho honesto e com respeito.

Dia de calor.
Que me fez recuar mais uma vez, à infância dos meus encantos.

Abraço.

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