A crónica de hoje surgiu depois dum passeio ao passado.
Nesta tarde fria, decidi não sair do meu aconchego.
Enquanto me ocupava com outras tarefas, viajei.
Aliás, como tantas vezes me acontece.
Gosto destas viagens.
Sobretudo quando me trazem recordações que me fizeram tão
feliz.
A minha avó materna, aos oitenta e tal anos, ficou confusa.
Trocava-se toda.
O seu cérebro deteriorou-se.
Nos dias de hoje, talvez se pudesse dizer que a minha avó tinha
Alzheimer ou coisa parecida.
Eu, adolescente, gostava de estar com ela, por isso, estava
sempre muito presente.
Gostava de a ouvir e brincar com ela.
Sei que, apesar de não me identificar como neta, gostava
muito de mim.
Logo que eu chegava, começava a conversar e dizia as coisas
mais desconexas que se possa imaginar.
Contava-me muitas histórias imaginárias sobre a sua própria
vida.
Um dia perguntou-me quem era eu.
- Sou sua neta – respondi.
Muito ofendida, disse logo.
- Eu nunca me casei! Não é que não tivesse quem me
quisesse!... Mas eu nunca fui nessa! Quando morrer, ainda levo o raminho da
palma!!!
Queria ela dizer que ainda era virgem!
Levava a mal quando eu, de riso fácil, me largava a rir.
A minha avó foi sempre uma pessoa recatada, mas depois, com a
doença, transformou-se. Metia-se com quem passava e dizia as coisas mais
inesperadas.
Dizia por exemplo, quando uma mulher com a higiene menos bem
feita aos sovacos passava por perto:
- Olha aquela! Leva ali o ninho da carriça!...
Às vezes deixava-nos embaraçados.
Se eu aparecesse de saltos altos e finos, dizia me:
- Ó menina, como é que consegue andar assim, em cima desse
prego caibral?
Era querida a minha avó Maria Isabel.
Chamava-me simplesmente «menina», tratava-me por «vossemecê»
e queria-me bem junto dela.
Falava, falava, falava.
Dissertava sobre o que, na hora, lhe passava pela cabeça.
Pura ficção.
Bons tempos eu passei com ela!
Abraço.
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