Há cenas e momentos da nossa infância que ficaram para sempre gravadas.
Aquela que hoje relato é uma delas.
Quando eu era pequena, havia sempre um dia no ano em que
apareciam na aldeia umas figuras vestidas de escuro, com cestos e sacos na mão,
que me intrigavam muito.
Diria até que, da primeira vez em que as vi, fiquei meio
amedrontada.
Apareciam sempre em grupos de três ou quatro.
Lembro-me que corri
para casa, e as perguntas surgiram em catadupa.
Quem eram, porque se vestiam assim, o que queriam, para quê
os cestos?
«São as Irmãzinhas da caridade e andam a pedir esmola para
os colégios onde pertencem,
porque são muito pobres».
Esta era a explicação de minha mãe, sempre pronta a
esclarecer-me.
O assunto não ficava para mim muito claro. Antes pelo
contrário.
Preocupada, questionava-me:
- Então e se derem pouco?
Preocupação de inocente!…
Na cabecita de uma criança não ficava clara aquela situação.
Lembro-me de que era um dia especial, em que as crianças da
aldeia apareciam todas com ar interrogativo.
Aquelas figuras eram vistas como pessoas diferentes.
A indumentária austera que usavam, penso que seria o motivo
do espanto inicial.
Apesar disso, eram pessoas afáveis e de sorriso fácil.
…
Bem mais tarde, já
espigadota e a iniciar-me na condição de mulher, a curiosidade pelo saber mais
e mais levou-me a descortinar os meandros de muitas coisas que até então estavam
nebulosas no meu subconsciente.
A velha e ainda actual canção de José Barata Moura («Vamos brincar à caridadezinha» - que pode ouvir aqui - basta clicar), foi mais um clique que deixou
tudo bem mais claro.
Abraço.
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