segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

O sótão


Há muitos anos atrás, quase todas as histórias começavam por: «era uma vez» … 
Ao ouvirem esta pequena frase, as crianças concentravam toda a sua atenção (por vezes tão difícil de captar) no que então começava a ser descrito. Hoje, e se não for muito maçador, também eu vou começar assim a pequena história verdadeira que vou contar. Era uma vez uma criança muito desejada e querida por toda a família. Nasceu, foi recebida com alegria e a protecção era permanente, nada podia faltar nem perturbar o seu crescimento, era a terceira de dois irmãos mortos pouco depois de nascerem. A ansiedade dos pais era muita e a necessidade de a proteger impunha-se. Tudo lhe foi proporcionado para que se desenvolvesse saudável e a sua socialização se fizesse normalmente e sem redomas a separá-la da realidade. Sem preparação específica, estes pais seguiram o seu instinto que por certo foram beber nas suas origens. Gratidão imensa!!!...
Estas crianças muito protegidas ficam por vezes demasiado caprichosas, mal-educadas, egoístas e pouco sociáveis. Neste caso, não aconteceu. A menina da história viveu e conviveu num espaço amplo, rodeada de amigas e condições para viver e pôr em prática todas as fantasias, criatividade e imaginação próprias da idade – e como são férteis estes factores naquele período da vida! Para dar largas a tudo isto havia o sótão da casa dos pais que tinha todos os condimentos necessários. Desde uma arca com roupa, mesa, bancos, sapatos (rasos e de salto), e ainda alimentos a sério para confeccionar as refeições imaginárias. Aquele sótão marcou pela positiva a vida daquela criança! Mais tarde, passada a idade de brincar ao faz-de-conta, refugiava-se lá. As transformações físicas e de personalidade foram digeridas aí, as alegrias e as angústias foram também partilhadas com algumas das companheiras de sempre. Os momentos eleitos eram os dias de inverno com chuva, vento e trovoada. Que belo refúgio, e que reconfortante que era aquele sótão!!! A vida deu muitas voltas… A criança um dia fez-se mulher: por motivos inesperados e tristes, teve que crescer mais rápido do que seria desejável, teve que abrir as asas e voar. A sua vida tomou outro rumo, o seu futuro não estava ali, o seu querido sótão e tudo o que viveu passou a fazer parte do passado, e arquivado na gaveta das suas memórias: as tais memórias que se recordam com saudade e às vezes nos deixam com uma certa melancolia no olhar. Ironia do destino: muitos anos mais tarde apareceu sem procurar, outro sótão na vida daquela criança já mulher. Diferente mas igualmente aconchegante e com o som do mar em fundo. A história repete-se?
Abraço.

1 comentário:

  1. È lindissima a tua história e acima de tudo fez-te recordar a tua vida, pois começaste na infancia e fizeste uma viagem até aos dias de hoje em que necessitavas do tal sotao.....
    Bjkas

    ResponderEliminar