quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Dois anos (marcas)












Guerra colonial. Durante todo este tempo, raramente conversei sobre o assunto.
Apenas pequenos apontamentos sem grande relevo ou importância.
Apesar disso, este tema teimava em aparecer.
Achei que seria bom pô-lo cá fora, tentar exorcizá-lo.
A verdade é que puxei por um fiozinho, e o novelo desenrolou-se.
E estava tudo tão presente tão presente, que pareceu que foi ontem.
Doeu um pouco, todas as recordações estavam vivas, tão nítidas, que mexeram um pouco comigo.
O que fiz foi porque eu própria precisei de enfrentar dentro de mim aquele período de emoções fortes e medos nunca sonhados.
Foi também para dar a conhecer aquilo que vai caindo no esquecimento.
Aquilo de que não se fala e que devia fazer parte dos compêndios escolares, porque é história.
Depois, e em último lugar, porque acho que o papel das mulheres dos combatentes foi sempre menorizado, quase esquecido.
Eu sei por experiência própria que eles sofreram mais que ninguém, que andaram em directo e ao vivo com o corpo às balas.
Que foram eles as maiores vítimas daquela chacina inútil.
Que eram eles que tinham que enfrentar as situações mais difíceis.
Mas e nós?
A renúncia a tudo, o deixar a família destroçada.
Trocar o país onde nascemos e onde nos sentíamos bem pelo desconhecido.
Adaptarmo-nos a uma civilização que não tinha nada a ver connosco.
Aguentar um clima muito difícil e quase angustiante.
Enfrentarmos o perigo.
Corrermos risco de vida.
E as que ficaram?
A dor da separação.
A agonia da dúvida.
O medo permanente de uma má notícia.
O correio que tardava.
O desespero da espera que se transformava num pesadelo.
Tenho escrito de uma forma apaixonada e sempre com a preocupação de ser verdadeira.
Numa situação destas, nunca se me pôs sequer a hipótese, de «romancear» ou dizer inverdades.
Tenho descrito a situação exactamente como a vivi, como a senti e baseada em alguns relatos sobre situações vividas.
A verdade não é a mesma para todos.
Cada um sentiu as coisas a seu modo, como é natural.
A minha visão terá decerto alguma imprecisão.
Eu não estava nos cenários da guerra.
Sei que no meio daquela injustiça toda, fui uma privilegiada.
Não fui eu que fiz as leis da tropa, simplesmente eu era casada com um alferes miliciano, que tinha alguns direitos (casamento que, felizmente, continua de pé).
Lamentei sempre que essas leis não fossem extensivas.
Temos que continuar a lutar por um mundo onde as diferenças não existam.
Abraço.

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