terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Sustos - continuação














Como a situação do ataque ao quartel foi considerada grave, o segundo comandante, em reunião, achou que era preciso assegurar a protecção à aldeia (Buco Zau).
Como a nossa casa era a mais encostada à mata, decidiram que era o local mais estratégico para o fazer.
Assim, se a ideia fosse entrar por ali, estaria mais protegido não só o bairro dos militares, mas a própria aldeia.
Durante uma semana ou mais, o grupo do meu marido que era de operações especiais,
dormiu na minha varanda.
Delírios, porque se tivessem querido mesmo, as bazucadas cairiam lá e teríamos vindo todos «numa caixa de pinho». 
(Oiça esta canção do Zeca Afonso: clique no link)

Quis Deus que assim não fosse. 
Anotámos a boa vontade, o zelo e a dedicação, com que aqueles rapazes desempenharam aquela missão.
Foram operacionais, atentos e principalmente mostraram grande amizade.
Sempre com boa disposição, mesmo que, para isso, tivessem que ir buscar força onde não existia.
Mais uma vez para todos o meu grande apreço.
Vocês muito mais que eu, que nós, foram as vítimas.
Não tinham apoio familiar, não tinham onde encostar o ombro, andavam para ali sem saber porquê, nem para quê.
Quantos problemas emocionais, quanto desespero.
Nos últimos dias de Abril (de 1974), chegou uma notícia ouvida por um soldado na rádio (penso que Brazzavile), que nos deixou a todos incrédulos e numa grande expectativa.
Tinha havido em Portugal, um golpe militar.
A incógnita era: que golpe terá sido?
Um mês antes, aquando do 16 de Março, nós os dois estávamos em Portugal.
Só passados alguns dias, penso que a 26, soubemos oficialmente que tinha acontecido aquilo que há muito todos os democratas queriam: o 25 de Abril.
Uma revolução pacífica, com os militares à frente, depôs o governo instalado há quase cinquenta anos.
Apesar de haver alguns indícios, foi uma surpresa que nos deu uma alegria indescritível.
Acabou a guerra.
A partir dali foi a festa.
Se o interesse por aquela guerra era nenhum, a partir daí, foi a pressa de virmos juntar-nos à festa.
Faltava pouco.
Como o meu marido terminava a comissão em Agosto, decidimos que eu vinha em Julho e vim.
Ele demorou um pouco mais. Chegou em Outubro.
Entretanto foi a descompressão.
Iniciaram-se conversações com o MPLA para fazer a paz e nessas conversações havia oficiais de ambas as facções.
Lá foi sabido de fonte segura, que aquele batalhão, aquele grupo da fitinha branca, esteve sempre debaixo de mira mas foi sempre poupado.
Penso que houve abraços de ambos os lados, lágrimas de alegria e reconhecimento.
Pena que, por motivos óbvios, só se soubesse mesmo no fim!..
Todo o sistema nervoso e emocional, ficou para sempre afectado.
Para não falar do físico.
Os senhores da guerra ficaram muito mal, sentiram-se sem apoio, ficaram sem aquilo que mais gostavam de fazer: GUERRA.
Abraço.

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